quarta-feira, 24 de março de 2010

Reflexão para Março de 2010:AMAR A NATUREZA VEM DO BERÇO - Lélio Costa e Silva

“É o velho galo que possui o conhecimento”. Provérbio grego

“Esta onça está muito velha! Por que vocês não arrumam outra nova?”
Como responsável técnico por um zoo fui interpelado por uma adolescente impaciente em seu sonambulismo juvenil. Preferi o silêncio – minha crença é pela compaixão humana onde a maturidade é um presente.
Não satisfeita, sorriu com desdém e completou: “bicho velho é muito feio”.
Olhando para a velha onça-parda, pensei baixinho: “espero que não tenha escutado...”
Qual seria o conceito de beleza para aquela jovem?
Por que o ser humano anseia uma vida longa, mas ao mesmo tempo, sonha em não envelhecer?
Olhando aquela menina, reflexo da descartabilidade, vi em seu sarcasmo, a representação de ser humano tão cedo desalojado de um mundo outrora encantado. Desanimado pensei: Com a visão embaçada pela mística da eterna juventude, tão apregoada pelos meios de comunicação, essa jovem se esquece que um dia “chegará lá”, ou seja, na velhice, última fase do ciclo de vida do ser humano.
Mas, rapidamente reuni em minha memória os fragmentos para a comunhão com o Todo. Recuperei o equilíbrio pensando nos animais. Por que tenho o privilégio de aprender com eles a cada dia. Assim pensei: afinal tudo na natureza exerce o seu papel. E os animais não estão no ambiente como figuras decorativas de uma paisagem. Ao contrário, também atuam...
Refletindo sobre a longevidade dos animais do zoológico comecei a estimar qual seria a idade de cada um e as lições que tenho recebido ao longo dos anos. Momentos únicos exemplificados por aqueles seres vivos. Não raro, sua sabedoria instintiva sempre foi surpreendente...
Como a história de uma macaca mais idosa de um bando que sabia como ninguém saborear um ovo de codorna, quebrando-o delicadamente com a habilidade superior a muitos primatas, sem perder uma gota do conteúdo.
Dois machos de ema - os mais experientes do bando, que normalmente disputavam a primazia de como o macho vencedor acasalar com todas as fêmeas para depois orgulhosamente se ocupar em fazer o ninho e chocar os ovos, resolveram quebrar esse ritual e entraram em acordo, alternando-se no choco. Sentados juntos tiveram a maior prole que se tem notícia na história do zoo. Zelosos, dividiram a tarefa de cuidar dos treze filhotes em parceria. Viraram manchete nos jornais locais.
A história vitoriosa dos jacarés de papo-amarelo que finalmente puderam procriar, depois de vinte anos de espera, após ganhar um espaço adequado com muita água e vegetação. Antes, instalados em recinto minúsculo, prudentemente a fêmea recusava qualquer aproximação. Hoje sabemos que os jacarés quantos mais idosos mais férteis se tornam...
Mas, agora mesmo, soube de um estudo alemão que revelou que as formigas doentes preferem morrer na solidão. Fazem isso para preservar as demais companheiras de trabalho de qualquer contágio já que são insetos sociais. O altruísmo em prol do grupo. E a lembrança das lições da biodiversidade aflorava-me.
Porém, mais adiante, fui despertado das divagações ao escutar um diálogo alegre de um senhor com sua criança que demonstrava seu deslumbramento com o canto das araras canindés. Naquele momento recuperei meu otimismo em vislumbrar um planeta mais saudável para as próximas gerações.
Lembrei-me de um colega de trabalho, meu “braço direito”, que atualmente encontra-se afastado por motivos de saúde...
Em sua sabedoria humilde de homem do campo, uma vez disse-me uma frase que nunca esqueci: “Amigo, amar a natureza vem do berço”.

* Médico-veterinário, educador ambiental, especialista em ecologia e conservação ambiental.

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