sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Reflexão para Outubro: OVOS E LARANJAS - Lélio Costa e Silva

Com tanta fome, aquele homem comprou de uma só vez, seis laranjas, de um vendedor na porta do zoológico. Imaginou que poderia sorver o caldo delicioso e depois comer o bagaço de todas elas. No entanto, de posse das seis laranjas, preocupou-se apenas em chupá-las rapidamente. Os bagaços esquecidos foram despudoradamente jogados ao chão. Absorto em seu passeio, chegou a tropeçar nas lixeiras ignoradas.
Livre, diante do recinto dos macacos-prego, arrotou retumbantemente, tentando chamar a atenção daquele grupo de primatas em cativeiro. Ninguém lhe deu importância. Num canto, uma velha macaca preparava-se para a sua refeição da tarde. Coincidentemente tinha recebido do tratador, seis ovos de codorna, fato que chamou a atenção do visitante. Teve início então o ritual alimentício da macaca. Com os ovos devidamente protegidos pela cauda semipreênsil, pacientemente, ela começou a bater o primeiro ovo suavemente contra o chão, com todo o cuidado. Cautelosa, arrancou com delicadeza alguns pedacinhos da casca, bebendo a clara e a gema como um “ manjar dos deuses ”. Após alimentar-se do conteúdo do primeiro ovo retirou pequenos pedaços da casca, lambendo-os um a um, aproveitando tudo. Somente depois de certificar-se que nada mais havia, é que passou para o ovo seguinte e assim, sucessivamente.
Intrigado, o homem insistia em chamar a atenção dos macacos. Impedido pela cerca, fazia caretas, pulava e abria os braços esboçando gestos caricaturais. Assobiava, batia palmas, gritava, cuspia e atirava objetos no viveiro. Sem sucesso.
E o tempo passou. Ovo por ovo, casquinha por casquinha, meia dúzia. Plena e satisfeita a velha macaca, por um fugaz momento, fitou aquele homem exaltado e ofegante. Indagando-se mutuamente, olhos de macaca e olhos de homem, por um segundo se cruzaram. E foi só.
De costas viradas para o estardalhaço, a velha macaca procurou um galho seco e se abrigou em seu cativeiro. Dormiu.
Anoiteceu. De repente, em meio ao desapontamento pela perda da “ guerra psicológica ”, o livre homem sentiu fome. E se lembrou dos bagaços de laranja que havia desprezado.

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