domingo, 25 de janeiro de 2009

Recado Da Fauna : MINHA HISTÓRIA - Mário Luís Bauer


Minha história poderia ser bem diferente, mas é igual a outras tantas. E infelizmente continuará sendo assim, pois não vejo como mudá-la. Não depende de mim exatamente. Explico-lhes: nasci livre, bem longe daqui num vasto território cheio de verde, água abundante, onde pude brincar e aproveitar todo o tempo com os da minha espécie.
Era uma época cheia de alegria, comida disponível, não havia escassez, tudo muito bom. Vivíamos juntos, animais e seres humanos. Ambos se respeitavam. Alguns de nós e outros pequenos animais nos tornamos seus animais de estimação, em completa comunhão.
Mas um dia tudo mudou graças à ganância de um ser que passou a se julgar superior. Minha vida tornou-se um pesadelo. Perdi minha família e o meu território. Antes, juntos com seres humanos, habitávamos os mesmos lugares, num mútuo respeito. No entanto, não consegui compreender quando as coisas começaram a mudar. As matas tornaram-se menores e a cada dia mais árvores foram derrubadas. Fogo e monstros metálicos que acabavam com tudo em poucos instantes e a mim só restou uma opção, a fuga.
Como viver em outros lugares sem comida e água, sem condições de sobreviver? Ah! Vocês devem estar pensando que eu queria luxo. Não é bem isso - só desejava minha casa novamente, onde nasci, fui criado e brinquei quando pequeno.
Assim, não tive escolha. Resolvi voltar às minhas origens, mas para o meu espanto, tudo o que existia antes havia acabado. No local, animais que eu nunca havia visto - possuíam dois chifres e mugiam muito diferente dos veados que conhecia. Eram barulhentos e bravos. Nem queriam amizade, juro que tentei.
Saibam, é muito difícil sobreviver fora da casa onde nascemos. E foi o que aconteceu comigo. Tinha que arrumar comida e a caça a que estava acostumado não existia mais, sendo por isso muitas vezes expulso por homens armados, pouco amistosos. Vi muitos de minha espécie morrerem e se tornarem troféus ou simplesmente tapetes. Tem gente que nos prefere imóveis e empalhados.
Um dia, exausto e com fome me vi cercado e sem lugar para ir. Lembro-me de alguém com uma arma apontando e então pensei - chegou meu fim. Ouvi um estampido e só me recordo de acordar em um lugar com grades, árvores, água e comida. Fui julgado, culpado e condenado a ficar em exposição até o final dos meus dias. Aqui sou bem cuidado, mas... Podem até achar que sou mal agradecido, mas é que nasci livre, e isso é o que gostaria de ter de volta, a minha liberdade. Mas também se resolvessem me soltar para onde iria agora?Onde foram parar as matas? As florestas estão cada vez menores...
Bem, estava na minha casa e acabei enjaulado. Hoje faço parte de uma lista onde figuram inúmeros animais, primeiros moradores desta terra e talvez tenha sido esse o nosso maior erro – chegar primeiro. Acho.
- Mas afinal, já sabem quem sou? Para alguns, um lindo animal com uma pelagem cobiçada, para outros uma ameaça.
- Corajosamente lhes digo: sou uma onça-pintada!
Mas tenho ainda uma esperança. Um dia a humanidade compreenderá o meu papel de predador neste Planeta. Saberá que também faço parte da teia da vida. E aí terá dado “o pulo do gato”, ou melhor, da onça!

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